Antonio Sousa-Uva
A Saúde
Ocupacional no seu sentido mais amplo é uma área científica, multi(e
trans)disciplinar, que objetiva um ambiente de trabalho saudável, seguro e
satisfatoriamente confortável e um trabalhador saudável, ativo e produtivo, sem
doenças naturais ou profissionais e apto e motivado para o exercício da sua
atividade profissional, com satisfação e desenvolvendo-se de forma pessoal e
profissional. A Medicina do Trabalho é indispensável a essa área de intervenção,
com enfoque na prevenção médica desses riscos profissionais, mas participando em
todas as outras áreas de intervenção. Dito de outra forma, a Medicina do
Trabalho é condição necessária, mas não suficiente, para se atingirem os
objectivos da Saúde Ocupacional.
O
número e a diversidade dos fatores de risco para a saúde potencialmente
existentes num ambiente de trabalho são consideráveis, diversificados e
relacionados com a atividade e as condições em que essa actividade é exercida.
Esses fatores são tradicionalmente classificados,
consoante a sua natureza, em fatores
físicos, químicos, (micro)biológicos, psicossociais e relacionados
com a atividade (ergonómicos, para alguns autores), todos eles susceptíveis de,
pelo menos potencialmente, poder causar efeitos adversos para a saúde.
O trabalho, em nenhuma
circunstância, deve, por isso, ser considerado adequado, na perspectiva da
Saúde e Segurança do Trabalho e, por isso, imutável, devendo adaptar-se aos
trabalhadores concretos que o realizam, mesmo em situações que possam surgir,
com necessidades de readaptação, recolocação ou, até mesmo, reconversão
profissional. É que cada posto de trabalho, para além da actividade e as condições
em que é exercida, inclui um trabalhador concreto cuja situação de saúde não é
estática, tal como a respectiva situação de trabalho.
A prevenção das
Doenças Profissionais e dos Acidentes de Trabalho são, também, e por isso, um
conjunto de medidas de intervenção “inacabado” e permanentemente adaptado a
cada situação concreta, que exige o concurso de todas as áreas de conhecimento
que possam contribuir para esse objectivo. A Medicina do Trabalho, qualquer que
seja a perspectiva de intervenção a esse nível, é uma área de conhecimento
insubstituível e, por isso, decisiva para se atingirem aqueles objectivos.
A Medicina do
Trabalho não pode, consequentemente, confinar-se à realização de “check ups” a trabalhadores (mais ou menos rigorosos) e, por isso, exige um conjunto de
conhecimentos que se “corporiza” numa especialidade médica criada há quase
cinquenta anos (em 1979) que, como as outras especialidades, exige um período
de formação específica para aquisição de conhecimentos, de conceitos essenciais
e de metodologias de intervenção.
A questão central é,
todavia, que a formação pré-graduada em Medicina do Trabalho dos cursos de
Medicina é (pelo menos, tendencialmente) nula e, por isso, aquela formação
específica deverá incluir, sempre, os aspectos estruturantes (teóricos e
teórico-práticos) indispensáveis à prática dessa especialidade, sob pena dessa
especialização poder mesmo contribuir para um processo que pode mesmo ser “autodestrutivo”
dessa mesma especialidade. Qualquer que seja a
reflexão que se faça nesses âmbito, e a perspectiva que se tenha quanto à sua intervenção, julga-se não ser isso o que se pretende!
Bibliografia
- Sousa-Uva, A (ed). Trabalhadores saudáveis e
seguros em locais de trabalho saudáveis e seguros, Lisboa: Petrica Editores, 2010.
- Sousa-Uva A, Serranheira F. Saúde, Doença e
Trabalho: ganhar ou perder a vida a trabalhar. Lisboa: Diário de Bordo, 2ª ed.,
2019.
- Sousa-Uva A, Serranheira F. Saúde ou Trabalho?
Lisboa: Diário de Bordo (no prelo).